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segunda-feira, abril 30, 2007

O ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA NO BRASIL

"Creio que a grande tarefa do professor (de Língua Portuguesa) é transformar o aluno em poliglota na sua própria língua. Ele não deve ficar circunscrito nem à língua da rua, nem à língua dos grandes escritores, mas ele deve saber utilizar a variedade de língua como ele deve saber utilizar a variedade de roupa, dependendo da natureza da festa para a qual ele é convidado." (Evanildo Cavalcante Bechara)

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O ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA NO BRASIL

Silvana Maria Moreli

É extremamente preocupante o quadro que se delineia diante dos nossos olhos, não só com relação ao ensino de Língua Portuguesa no Brasil, como também com relação ao ensino num contexto mais amplo. A análise estatística de dados pertinentes à educação no Brasil traz à tona informações alarmantes, como por exemplo, o baixo índice de aprendizagem por parte dos alunos. São evidências de um ensino capenga, calcado em moldes defasados e que se encontra totalmente perdido, navegando a esmo sem um caminho traçado ou uma meta a alcançar. São tantas indefinições nesse âmbito que chega-se a pensar que a ignorância é um mal que não pode ser completamente extinto, haja vista a necessidade política de se manipular as pessoas em benefício próprio. Logo, é muito mais fácil usar desse artifício se o nível cultural dessas pessoas for nulo (ou quase isso).

Estatisticamente, se analisarmos algumas avaliações da UNESCO, veremos que os resultados são catastróficos. A ONU, em parceria com a UNESCO, num processo de organização para avaliar a qualidade de vida dos povos, criaram índices de avaliação, o Pisa (Programa Internacional de Avaliação de Alunos). E foi em 2000 que o Brasil foi escolhido para ser avaliado, sem aviso prévio ao Ministério da Educação e foi classificado em último lugar dentre os 31 países participantes. Alegou-se na época que o mau resultado ocorrera pelo fato de que os alunos avaliados eram da escola pública e os melhores alunos, os mais eficientes, concentravam-se nas escolas particulares. Infelizmente, em virtude do Brasil ser um país cuja distribuição de renda é completamente comprometida, a repercussão dessa avaliação atingiu um alto índice de indignação.

Em 2001 uma nova avaliação foi feita e o Brasil continuou em último lugar. Na prova de leitura aplicada ficou à frente de quatro nações apenas: Macedônia, Indonésia, Albânia e Peru. A Finlândia, o Canadá e a Nova Zelândia obtiveram as maiores médias. Em Matemática e Ciências, os melhores rendimentos foram de Hong Kong, Japão e Coréia do Sul.

Em 2003, uma outra avaliação foi aplicada e dessa vez houve uma irrisória melhora e o Brasil se colocou em 37º lugar em Leitura e e em penúltimo lugar em Matemática e Ciências, o que na média das três áreas o país ficou em penúltimo lugar, na frente apenas do Peru. E vale ressaltar que os testes foram aplicados em crianças com 15 anos de idade em 41 países e não somente em escolas públicas, o que demonstra quão grande é o rombo ou como as coisas vão mal.

Para Marcos Bagno, doutor em Lingüística da USP, as notas baixas no Pisa são resultado da maneira equivocada com que a escola encara o ensino de Língua Portuguesa: "Pesquisas apontam que o grande foco do ensino de língua portuguesa está na gramática, pois a maior parte dos professores dedica setenta por cento de suas aulas às normas, quando a ênfase deveria ser na leitura e na escrita".

Segundo Cláudio de Moura Castro, economista e consultor em educação, os dados do Pisa são prova de que as escolas estão ensinando muitas coisas, mas não o essencial: o domínio da linguagem. "Das mil coisas e conteúdos que a escola faz ou tenta fazer, o Pisa está nos mostrando que ela se esquece da mais essencial: dar ao aluno o domínio da linguagem. Se fosse necessário gerar um slogan para todas as escolas de todos os níveis, esse seria: só há uma prioridade na escola brasileira: ensinar a ler e entender o que está escrito".

Para Nelio Bizzo, professor da Faculdade de Educação da USP e responsável pela coordenação da área de Ciências do Pisa, as questões, discursivas e de múltipla escolha, são elaboradas com a ajuda dos países participantes. O exame, portanto, faz um diagnóstico significativo da educação brasileira. "Os testes foram feitos por alunos de escolas públicas e particulares de todos os cantos do Brasil, de Norte a Sul, de todas as classes sociais, o que torna o Pisa um indicador preciso de nosso sistema educacional. (...) Os exames nacionais, como o Enem e o Saeb, apresentam falhas estruturais, pois se baseiam em questões de múltipla escolha, que praticamente não permitem que o aluno tire nota zero."

O fracasso da educação no Brasil está estampado na mídia constantemente, mas emerge com maior veemência quando um teste internacional como esse é aplicado e o resultado alcançado é lamentável, para não dizer dramático. À lista de causas para o mau desempenho dos alunos soma-se além da pobreza, o baixo salário do professor e a falta de qualificação do mesmo, a baixa escolaridade dos pais - estudantes com desempenho muito crítico normalmente são criados por adultos que nunca estudaram ou cursaram apenas o ensino fundamental (1ª a 4ª série). Além disso, o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) registra que uma criança brasileira entre 7 e 14 anos, filha de mãe com baixa escolaridade tem onze vezes menos chances de freqüentar a escola que uma criança filha de mãe com alta escolaridade. E, outra causa, não menos importante do que as demais, refere-se ao trabalho infantil que acaba prejudicando o aprendizado, bem como gerando grandes índices de evasão escolar.

A bola da vez é a alfabetização que aparece como destaque negativo, mas, nos últimos tempos, a Matemática e a capacidade de leitura também obtiveram resultados vexatórios nesse tipo de exame internacional. É no mínimo preocupante e causa indignação, saber que o Brasil ocupa uma colocação tão lastimável no ranking mundial da educação. Isso mostra nossa incapacidade de oferecer uma educação fundamental de qualidade para a maioria das pessoas, mostra a falta de vontade política dos nossos governantes, mostra como a situação do ensino brasileiro encontra-se maquiada - a maquiagem cobre superficialmente as imperfeições, mas não consegue exterminá-las. Não se consegue oferecer salários dignos, não se consegue dar continuidade em programas de qualificação profissional, não se consegue colocar em prática projetos que vislumbrem uma melhoria na qualidade do ensino, não se consegue criar condições satisfatórias para uma educação de qualidade. Toda essa negatividade leva a crer que o fator pedagógico está intrinsicamente ligado ao social e só haverá solução plena quando ambos forem repensados e trabalhados com afinco para a obtenção de melhores resultados.

No Brasil, fala-se muito em alfabetização e pouco (ou nada) se tem feito de concreto para melhorá-la, talvez nem mesmo o básico. Acredita-se que para proporcionar um ensino de qualidade às crianças de camadas mais humildes da sociedade, seja necessário abolir a demagogia e agir de forma concreta no sentido de criar oportunidades. É preciso repensar a aprovação automática, a progressão continuada - um aluno que não sabe ler, escrever e contar nas primeiras séries não deve atingir séries mais elevadas; ele mesmo se sentirá deslocado, não produzirá e, conseqüentemente será desmotivado a aprender. Isso é exclusão. Mascarar o índice de repetência dos alunos em prol da conquista de verbas internacionais para a Educação, isso tem outro nome.

Se não houver essa conscientização, o dinheiro público continuará a sumir dos cofres por meio das mãos de políticos corruptos que, às vésperas das eleições constróem algumas creches e escolas para demonstrar a dimensão astronômica da preocupação dos mesmos com a educação. Falta brio, falta decência, falta comprometimento. Sabe-se, porém, que qualquer mudança nessa área corresponde a uma trajetória árdua e lenta, uma vez que nada muda do dia para a noite e é, sobretudo, necessário que haja investimentos e trabalho - muito trabalho.

Com relação ao ensino da Língua Portuguesa, o professor Evanildo Cavalcante Bechara nos diz que o português está entregue à própria sorte e uma das conseqüências é a falta de um vocabulário mais refinado por parte do professor. De modo geral, ele não tem uma boa leitura literária e, na sala de aula, ao invés de usar textos literários, dá preferência aos textos jornalísticos. Não que estes não sejam importantes ou não devam ser colocados para os alunos, porém, o texto jornalístico "rouba" dos alunos a "oportunidade de alargar seus horizontes dentro da própria língua", uma vez que não apresentam metáforas, metonímias ou comparações. Sendo assim, o aluno fica desarmado diante de um texto literário e não consegue lê-lo ou até mesmo interpretá-lo.

O Pisa indica que no Brasil ocorre um decréscimo significativo dos índices de domínio de competências básicas como por exeplo, produzir seus próprios textos e/ou estabelecer relações lógicas entre elementos de sentido presentes em vários espaços narrativos, ou seja, nossos alunos estão tornando-se "analfabetos funcionais".

A complexidade do problema concentra-se no fato de que o aprendizado do português deveria ocorrer no ensino fundamental. Reforça-se a idéia de que o ensino fundamental, os primeiros anos escolares, são vitais para a formação do aluno. Estes servem de alicerce para embasar o saber e o conhecimento. Acredita-se que medidas paliativas, nessa altura do campeonato, não surtam o efeito desejado. Há que se estabelecer medidas mais drásticas, do tipo que ataquem os problemas pelas raízes e criem mecanismos que consigam dar à Educação a importância e o valor que lhe são de direito.

Eu (ainda) acredito na Educação e espero que a mesma não seja apenas uma palavra de efeito, um tema para discursos inflamados de políticos que a utilizam como recurso básico para impressionar os eleitores, vencer nas urnas e depois, guardá-la para as próximas eleições ou usá-la, de acordo com a circunstância e necessidade.

*** Respeite os direitos autorais. Se for usar algum texto desse blog, parcial ou totalmente, não se esqueça dos créditos. Obrigada! ***

3 comentários:

Borrasca mundi disse...

Muito bom o seu artigo sobre o ensino de português no Brasil. Só tome cuidado quando for falar sobre o ensino de literatura e jornalismo nas escolas. A literatura é ensinada nas escolas sim, de maneira um pouco descontextualizada e equivocada, talvez, o que faz com que os alunos não despertem interesse por ela. Quanto à utilização de textos jornalísticos em aulas de língua portuguesa, acho isso muito bom, até pelo fato de que se trata de uma linguagem mais próxima e acessível ao estudante brasileiro. Cuidado, também, quando diz que falta vocabulário aos professores. Esse tipo de comentário soa, no mínimo, purista para um artigo tão interessante como este. E mesmo tendo o Bechara como argumento de autoridade, não deixa de soar purista. Lembre-se de que o próprio Bagno já criticou severamente o Bechara, chamando-o gramático da Direita.
Parabéns!!!
(enedius.blogspot.com)

Mota disse...

Bom o artigo, acho que é isso mesmo. Nossa educação começa de cima para baixo, no Brasil não existe educação básica aos olhos de políticos. A base realmente está na base, sua idéia está correta não tem purismo, escritor com Bagno não é nenhum pouco purista, muito bom.
http://osvaldomota.blogspot.com

Unknown disse...

Professora adorei o artigo!
Mas qual é o livro de Bechara a que pertencem as citações?

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