As gramáticas
portuguesas e brasileiras tradicionais – como a Nova
Gramática do Português Contemporâneo, do brasileiro Celso Cunha
e do português Lindley Cintra, ou a Moderna Gramática Portuguesa,
de Evanildo Bechara – também concordam: “Quanto aos substantivos
terminados em -e, uns há que ficam invariáveis (amante, cliente, doente,
inocente), outros formam o feminino com a terminação em “a”: alfaiata, infanta,
giganta, governanta, parenta, presidenta, mestra, monja. Observação:
“governante”, “parente” e “presidente” também podem ser usados invariáveis no
feminino.”
“Presidenta” está no Dicionário Aurélio desde a
sua primeira edição, em 1975 (ver aqui); está no Vocabulário Ortográfico da
Língua Portuguesa (VOLP) da Academia
Brasileira de Letras desde a sua primeira edição, em 1932; no Dicionário da Academia Brasileira de Letras; e
estava já no primeiro Vocabulário Ortográfico
sancionado pela Academia de Lisboa, de Portugal, em 1912 (o vocabulário integral
pode ser acessado aqui).
Presidenta já aparecia também em textos de nossos melhores escritores
dois séculos atrás: Machado de Assis, por exemplo, usa “presidenta”
em Memórias Póstumas de Brás Cubas, sua obra-prima,
publicada em1881 e disponível gratuitamente aqui.
Anos
antes, em 1878,
o português O Universo Ilustrado narrava o
enterro fictício de uma “presidenta”; em 1851,
a Revista Popular de Lisboa
também se referia à “presidenta” de uma reunião.
Ainda em Portugal,
podemos encontrar presidenta no
primeiro vocabulário oficial da língua portuguesa,
elaborado em 1912 por Gonçalves Viana (disponível
aqui) .
“Presidenta” está
também no vocabulário do português Rebelo Gonçalves (1966),
e, desde um século antes, no Dicionário de Português-Alemão
de Michaëlis (1876), no de Cândido de Figueiredo (1899), no Dicionário Universal / Texto
Editores (1995), na primeira edição do Dicionário Lello (1952)
e na primeira edição do Dicionário da Língua Portuguesa
da Porto Editora (também de 1952).
Na verdade,
ainda antes disso – no ano de 1812 (antes
ainda, portanto, da independência do Brasil de Portugal), a palavra “presidenta” já aparece
dicionarizada: está no Dicionário de Português-Francês de
Domingos Borges de Barros, que viria a ser diplomata e senador. Versão
digitalizada do dicionário, de 1812, pode ser acessada aqui.
Por falar em outras
línguas: não apenas no francês, mas também nas línguas irmãs do
português, o galego e
o espanhol, presidenta é
considerado o feminino mais gramaticalmente correto de “presidente“.
A palavra “presidenta” nada tem a
ver, portanto, com Dilma Rousseff ou com o PT, e quem se recusa a usar a
palavra por achar que é uma invenção recente de petistas está apenas atestando
ignorância em relação à língua portuguesa.
Isso porque a forma “a presidenta” é, na verdade, mais antiga e mais
tradicional na língua portuguesa que “a presidente”.
Como se pode ver em todos os
dicionários e vocabulários oficiais anteriores a 1940 (por exemplo: aqui, aqui, aqui, aqui, aqui, aqui), até a metade
do século passado a palavra “presidente” era
considerada substantivo exclusivamente masculino,
e “presidenta” era o único feminino aceito para “presidente”.
Em outras palavras:
apenas a partir de 1940 a forma “a
presidente” passou a ser aceita por gramáticos e dicionaristas
portugueses e brasileiros. Ou seja: a palavra “presidenta“,
dicionarizada desde 1812, é mais antiga e tradicional em português que a forma
neutra “a presidente“, apenas
dicionarizada a partir de 1940.
A passagem, no
século passado, de “presidente”
como forma exclusivamente masculina para forma neutra baseou-se no mesmo
processo de “neutralização de gênero” pelo qual passaram, e vêm até hoje
passando, vários outros substantivos portugueses – como “a parente”, que
antes antes só se dizia “parenta” -, sobretudo profissões – como “a
oficial” (que antes só se dizia “oficiala”), “a cônsul” (que antes só se
dizia “consulesa”) ou “a poeta” (que antes só se dizia “poetisa”).
A Revista Veja, por exemplo, deixou de usar
a palavra “presidenta” apenas quando Dilma Rousseff chegou ao poder e disse que
gostaria de ser chamada assim. Até então, porém, a mesma Veja usava
“presidenta”- vide exemplos de edições da década de 1970 (ao se referir à então presidenta deposta da Argentina),
de 1980, de 1990 e
mesmo 2000.
Do mesmo modo, anos
antes de o PT chegar ao poder, os demais órgãos de imprensa usavam
“presidenta” – como a Folha
de S.Paulo – por exemplo, em 1996 (“Secretária de Turismo de Alagoas e presidenta da Fundação“), 1997 (“Segundo a presidenta da CPI,
deputada Ideli Salvatti“), 2003: (“A presidenta da CDU e líder da bancada parlamentar, Angela Merkel,
já deixou claro que seu partido não se dispõe a salvar a situação para o
governo de Berlim.“), etc.; O
Estadão (em 2004:”Empresária de Shakira era presidenta da companhia“;
em 2008: “disse a presidenta da
Plataforma, Maribel Palácios“, etc.), o Correio Braziliense,
etc.
Em resumo: hoje, é indiferente o uso de “a presidenta” ou “a
presidente” – ambas as formas são gramaticalmente corretas e equivalentes.
Mas, ao contrário do que diz o senso comum e do que supõem muitos em sua
ignorância, “a presidenta” não é informal, não é uma invenção recente nem
é “coisa de feministas” ou “de esquerdistas” (pelo contrário, é a forma
mais antiga e tradicional em língua portuguesa).
Um bom exemplo de sensatez, por
exemplo, vem do governador de São Paulo,
Geraldo Alckmin, do PSDB– um dos principais opositores de Dilma
Rousseff, que, no entanto, nunca deixou de falar “presidenta“, por saber que essa forma é antiga,
tradicional e perfeitamente correta em português.
E, para fechar, um videozinho de programa educativo da TV Cultura de
1996, mostrando que ninguém estranhava o uso de “presidenta” no Brasil… até
Dilma Rousseff chegar ao poder e pedir para ser chamada assim:
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Fonte: Dicionário e Gramática
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